sexta-feira, 17 de julho de 2015

O mar e as emoções



                    

Foi no último verão. Em férias com a família em uma bela praia, ela se surpreendeu com os sentimentos que lhe afloraram diante do mar.
O verde-azul das águas que se abraçavam ao vasto horizonte, o ímpeto e a força das ondas nas rochas, ilhas que se perdiam ao longe, gaivotas em círculos no céu alaranjado do poente, crianças brincando na areia,  barquinhos na tarde e o frescor da brisa-marinha estremeciam-lhe o corpo e as arrebentações dos sentidos   sacudiam-lhe a alma.  Passava longo tempo a contemplar a beleza do entardecer e o ir e vir das ondas a eternizar as imagens do Pôr do Sol. Pensava nos códigos que a natureza formula e obedece para produzir efeitos tão belos, o quanto transgrediu em generosidade para adaptar-se, em  bilhões de anos,  e  produzir o espetáculo dos efeitos de suas inesperadas concepções. Pensava nas mudanças bruscas e drásticas ocasionadas pelos movimentos das forças naturais ou por interferência do homem. Sua alegria tornava-se como a tarde, lânguida e silenciosa, agonizante.
Sentia-se como gaivota que foge do bando e voa para  ilhas longínquas, distantes de toda civilização - como sabem os pássaros migrar e abrigar-se nelas, à procura de alimento e proteção?  E as embarcações com velas içadas,  para onde vão, sem se despedir? Haveria nas ilhas o sentimento do mundo de que falava o poeta Carlos Drummond de Andrade?
Os camaradas não disseram que havia uma guerra/ e era necessário trazer fogo e alimento. / Sinto-me disperso, /anterior a fronteiras, /humildemente vos peço/ que me perdoeis.”
Talvez as ilhas nada saibam das tragédias humanas e dos desastres na natureza. E nós, isolados no universo, dispersos, sem o fogo e o alimento da autopreservação, pediremos perdão?
Aquelas férias foram marcantes para a mulher. Fez retornos a tempos vividos e não vividos, inventou novas  rotas para o caminho do coração e ganhou presentes do mar.
Numa dessas tardes, viu pequenos barcos de  pescadores surgirem entre as águas e no mesmo instante ouviu os gritos eufóricos do netinho que, em companhia do pai, pulava altas ondas.  Sentou-se na areia e vibrou com as brincadeiras do menino e a alegria dos pescadores que voltavam do mar com seus peixes.
A intensidade do momento trouxe luz ao seu pensamento e mais uma vez teve certeza de que a vida é assim mesmo, feita de altos e baixos, como ondas que vão e vêm. Sentiu a dor da saudade de tempos idos e que a vida agora fazia suas preciosas acomodações.
Sentimo-nos, tantas vezes, isolados como pássaros em  ilhas e perdemos o sentimento do mundo; mergulhamos em águas profundas ou deslizamos como barcos sem rumo.
Talvez possamos aprender com a natureza que das fragilidades pode vir a força que nos faz avançar até o continente e, em terra firme,  acolher as tempestuosas  precipitações dos    acontecimentos. Possamos, quem sabe,  ser como as encostas rochosas das montanhas onde as ondas batem com desmedida força para em seguida se desmancharem em espuma, como brancas quimeras.

Regina Gaiotto - Revista Vitrini - Julho/2015

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