Foi no último verão. Em
férias com a família em uma bela praia, ela se surpreendeu com os sentimentos
que lhe afloraram diante do mar.
O verde-azul das águas que
se abraçavam ao vasto horizonte, o ímpeto e a força das ondas nas rochas, ilhas
que se perdiam ao longe, gaivotas em círculos no céu alaranjado do poente, crianças
brincando na areia, barquinhos na tarde e
o frescor da brisa-marinha estremeciam-lhe o corpo e as arrebentações dos
sentidos sacudiam-lhe a alma. Passava longo tempo a contemplar a beleza do
entardecer e o ir e vir das ondas a eternizar as imagens do Pôr do Sol. Pensava
nos códigos que a natureza formula e obedece para produzir efeitos tão belos, o
quanto transgrediu em generosidade para adaptar-se, em bilhões de anos, e produzir
o espetáculo dos efeitos de suas inesperadas concepções. Pensava nas mudanças
bruscas e drásticas ocasionadas pelos movimentos das forças naturais ou por
interferência do homem. Sua alegria tornava-se como a tarde, lânguida e
silenciosa, agonizante.
Sentia-se como gaivota que
foge do bando e voa para ilhas
longínquas, distantes de toda civilização - como sabem os pássaros migrar e
abrigar-se nelas, à procura de alimento e proteção? E as embarcações com velas içadas, para onde vão, sem se despedir? Haveria nas
ilhas o sentimento do mundo de que falava o poeta Carlos Drummond de Andrade?
“Os camaradas não disseram que havia uma
guerra/ e era necessário trazer fogo e alimento. / Sinto-me disperso, /anterior
a fronteiras, /humildemente vos peço/ que me perdoeis.”
Talvez as ilhas nada
saibam das tragédias humanas e dos desastres na natureza. E nós, isolados no
universo, dispersos, sem o fogo e o alimento da autopreservação, pediremos
perdão?
Aquelas férias
foram marcantes para a mulher. Fez retornos a tempos vividos e não vividos, inventou
novas rotas para o caminho do coração e
ganhou presentes do mar.
Numa dessas tardes,
viu pequenos barcos de pescadores surgirem
entre as águas e no mesmo instante ouviu os gritos eufóricos do netinho que, em
companhia do pai, pulava altas ondas. Sentou-se na areia e vibrou com as
brincadeiras do menino e a alegria dos pescadores que voltavam do mar com seus
peixes.
A intensidade do
momento trouxe luz ao seu pensamento e mais uma vez teve certeza de que a vida
é assim mesmo, feita de altos e baixos, como ondas que vão e vêm. Sentiu a dor
da saudade de tempos idos e que a vida agora fazia suas preciosas acomodações.
Sentimo-nos, tantas
vezes, isolados como pássaros em ilhas e
perdemos o sentimento do mundo; mergulhamos em águas profundas ou deslizamos
como barcos sem rumo.
Talvez possamos
aprender com a natureza que das fragilidades pode vir a força que nos faz avançar
até o continente e, em terra firme, acolher
as tempestuosas precipitações dos acontecimentos. Possamos, quem sabe, ser como as encostas rochosas das montanhas
onde as ondas batem com desmedida força para em seguida se desmancharem em
espuma, como brancas quimeras.
Regina Gaiotto - Revista Vitrini - Julho/2015
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